Capítulo 1



Lembranças perdidas 

 

Minha respiração estava pesada e minha cabeça doía drasticamente. Abri devagar meus olhos, que ardiam marejados, piscando. Havia manchas na minha visão e esperei calmamente enquanto essa sensação lentamente passava.  
Percebi que estava deitado em uma cama e havia cobertores sobre mim,  protegendo meu corpo do frio e me passando uma sensação de paz. Estava escuro, mas não como era à noite e sim como se houvessem cortinas no local. Não me importei com nada naquele momento, tentei me acomodar melhor entre as cobertas ignorando leves pontadas de dor que senti pelo meu corpo. O que exatamente significava aquilo? Eu não sabia e não estava nem ai, pelo menos por enquanto. Voltei a fechar meus olhos, pronto para me meter em mais uma longa soneca, quando ouvi um leve pigarreio veio a alguns metros do lado da cama.
-          Hã... V... Você acordou certo? - uma voz baixa e tímida falou devagar como se estivesse esperando algo acontecer.
Sentei-me rápido em um movimento brusco e minha cabeça doeu muito me obrigando a voltar para minha posição inicial, que era deitado confortavelmente na cama, enquanto meu mundo girava sem parar. Gemi de dor e dessa vez, sem levantar, voltei meu olhar desconfiado para a voz de antes me deparando com uma garota pequena, de olhos azuis esverdeados e cabelos claros. Não tinha certeza se eram loiros ou castanhos por causa do quarto escuro, só notei que eram bem claros. Percebi também que ela estava um pouco encolhida e com músculos contraídos, como se estivesse pronta para fugir de algo. Seus olhos que até então não me encaravam, encontraram, finalmente, os meus e eu percebi que o motivo de sua cautela era eu.
Ela estava com medo? De mim? Não, eu não costumava dar medo as pessoas, eu era... era... O que eu era mesmo? Coloquei a mão na cabeça tentando me lembrar e ela falou com uma voz preocupada:
-          Você está bem? Está doendo em algum lugar?
-          Sinto muito, mas eu te conheço? - falei me assustando com minha própria voz. Não me lembrava de ter a voz assim.
-          Hã... Não eu... Só... - ela se encolheu mais ainda em seu canto.
-          Está com medo de mim, garota? Não há nada a temer. - disse me sentando com raiva e ignorando a dor – Poxa! O que está havendo aqui? Quem é você? O que estou fazendo nesse lugar?
-          Eu sou Nabel e você está na vila Houaiss. Nós te encontramos perto das margens do rio Karstron muito ferido e resolvemos ajudá-lo. É só isso. Não sei de mais nada. Sinto muito. Sinto muito. - Ela fechou seus olhos e sacudiu sua cabeça repetindo suas ultimas palavras, o que a fez parecer muito mais delicada, enquanto seu cabelo que batia nos ombros balançava de um lado para o outro sem parar.
-          Nós? – falei cautelosamente para não assustá-la.
-          Sim. Eu e minha mestra Nair. Nós cuidamos de seus ferimentos e...
-          Ferimentos? Que tipo de ferimentos? – interrompi seu relato confuso. Por que infernos eu estava ferido?
-          Você levou uma forte pancada do lado esquerdo da sua cabeça, além disso, havia um corte profundo indo do seu peito as suas costas. Sua sorte foi termos te encontrado em tempo. Você quase precisou de uma transfusão de sangue! - disse ela parecendo um pouco aliviada.
-          E como eu me feri?
-          Eu... não sei...
-          Não minta para mim! – disse rude, fazendo-a encolher e fechar os olhos. Minha cabeça doeu e coloquei a mão na testa e quase implorando perguntei: - Por favor... O que está havendo? – Vendo que ela simplesmente balançava a cabeça com pena, comecei a tentar me lembrar dos últimos acontecimentos, porém o que notei foi algo que apenas me assustou mais. Voltei a falar tentando me agarrar a qualquer tipo de esperança que ainda eu pudesse ter: - Você não me conhece garota? Quem sou eu? De verdade?
-          Eu realmente não sei e... espera! Você não sabe quem você é? – ela perguntou surpresa e eu balancei a cabeça
-          Claro que não, se estou te perguntando. - suspirei - Desculpe. Eu estou nervoso. Não me lembro de nada!
-           Espere um minuto, por favor. - ela se levantou e correu para a porta
-          Aonde você vai? - chamei nervoso.
-          Não se preocupe! – Ela sorriu gentilmente me tranquilizando – eu só vou buscar a Dona Nair. – ela disse e vendo meu olhar confuso acrescentou: - Como eu te disse antes, ela é minha mestra e a melhor curandeira da região. Estaremos cuidando de você por enquanto.
Dizendo isso ela se retirou do recinto. Comecei a me penalizar por ter sido tão mal educado com alguém tão doce como ela. Precisaria me desculpar futuramente, porém, coloque-se no meu lugar: um dia você acorda em um lugar desconhecido e percebe que além de machucado, você não sabe quem você é. Qual seria sua reação?
Respirei fundo e comecei a tentar me distrair com o recinto em que me encontrava. O local não era escuro e nem claro e como eu havia imaginado antes estava escuro não porque era noite, e sim porque grossas persianas cobriam a janela deixando passar apenas alguns vislumbres da luz do dia. O recinto, como o esperado, era um quarto bem simples: tinha uma cama, um criado mudo, uma cadeira e um quadro o qual eu não conseguia ver a figura que estava desenhada.
    

-          Droga. - murmurei colocando as mãos na minha cabeça e as apoiando na perna. - Porque não me lembro de nada? Quem sou eu? O que fizeram comigo?
Nabel

2 comentários: